terça-feira, 4 de novembro de 2008

Na praia

Acabe logo com isso, sinalizavam as amigas estendidas ao sol em seus biquínis multicoloridos. Pela primeira vez na temporada, seus pés tocavam a areia firme e plana, que tanto a sul quanto a norte parecia se estender imutável ao infinito. Sentia o novo peso na parte superior do corpo, a estranha oscilação que era a um só tempo incômoda e deliciosa. Todos a olhavam passar, os caras mais gatos, uns tios com olhos sacanas, as gurias estavam certas, não fazia sentido continuar com ele. O verão passa rápido demais, era um desperdício estar presa, e, de mais a mais, era natural ela procurar coisa melhor.
Avistou-o mar adentro, tentando pegar jacaré. Sentindo que a coragem insuflada pelas outras podia lhe escapar, avançou com mais velocidade. Ia com a água pelos joelhos quando ele a avistou, deixando que uma onda o levasse na direção dela. Ao se erguer, não pôde deixar de reparar naquela novidade que ainda não tocara. Tem que desinchar, ela dizia, sempre escapando ao toque. Seja direta, e se ele chorar, diga que o problema não é com ele, é contigo, ecoou o conselho da amiga de biquíni preto. Que foi, que está me olhando?, ele perguntou.
Ela respirou fundo e seguiu conforme o planejado. Foi direta e irredutível, em dois minutos apresentou cinco razões para não continuarem juntos e, para completar (o que lhe pareceu caridoso e uma demonstração de grandeza de espírito), acrescentou que o problema era com ela.
O rapaz ficou sem reação. Teve vontade de se agarrar àqueles peitos, ele que tinha passado um mês inteiro esperando, que acompanhara toda a recuperação, e agora tudo era tão simples, ficamos assim e pronto, e lá ia outro tocar no que era dele.
A menina beijou-lhe o rosto, fez um carinhosinho em seu ombro e se virou. Caminhou devagar de volta à praia, o coração leve, lá estavam elas, logo reconheceriam sua vitória...
O coração queimando, Guto saiu da água, viu à distância como ela se refestelava na frente das outras. Sentiu a visão turvar. Cravou os dedos fundos na areia seca além da rebentação. As mãos conjuradas apanharam um mastro de guarda-sol abandonado, na ponta o encaixe de metal coberto de ferrugem.Imersa em sua alegria, não percebeu a sombra veloz que cruzou a areia.